Em 2017 morreu, um dia após completar 71 anos, o
compositor Luiz Grande. Embora morto, sua música “Caviar” eternizou-se na voz
de Zeca Pagodinho. Luiz Grande pergunta de início na obra: “Você sabe o que
é caviar?” E responde: “Nunca vi, nem comi eu só ouço falar!” O
compositor e artista justifica: “Caviar é comida de rico; curioso fico, só
sei que se come. Na mesa de poucos, fartura adoidado, mas se olhar para o lado
depara com a fome. Sou mais ovo frito, farofa e torresmo, pois na minha casa é
o que mais se consome. Por isso se alguém vier me perguntar, o que é caviar, só
conheço de nome!” É... eita Caviar difícil de comer hein! Mas e a
Democracia, o Caviar dos sistemas políticos de governo, como tem sido sua
degustação?
O Estado Democrático, nos tempos
modernos foi uma das gloriosas conquistas que o Ocidente já obteve. Desde muito
tempo antes mesmo de Cícero, no inicio da era cristã, já se sabia os males que
o mundo sofreria, e sofre, com formas de governos inclinados a controlar a vida
das pessoas de forma a cercear seus direitos humanos, afinal de contas já dizia
o sambista: Na mesa de poucos, fartura adoidado, mas se olhar para o
lado depara com a fome. A República foi entre os antigos uma instituição do
povo para o povo dentro de um consenso jurídico numa comunidade de interesses,
basicamente. Então se discutia as formas de governo que atingiriam tais ideais.
Se discutia como a receita do “Caviar” poderia ser melhorada e como todos
poderiam tê-la disponível.
Contudo, desde os primeiros séculos
de nossa era, os homens conheceram as mais amargas formas de governo: Impérios,
reinos, principados, em suas formas absolutistas, monárquica, despótica,
ditatorial, etc, sem dizer sobre suas faces religiosas. Passados muito tempo,
desde os antigos até os modernos e cansados de cantar: ...Sou mais ovo
frito, farofa e torresmo, pois na minha casa é o que mais se consome. Por isso
se alguém vier me perguntar, o que é caviar, só conheço de nome! Você sabe o
que é caviar? Nunca vi, nem comi eu só ouço falar. Mas você sabe o que é
caviar? Nunca vi, nem comi eu só ouço falar... a experiência de fugir para
longe dos sistemas de governo e o anúncio de um apocalipse próximo que só se
antecipava, não se sustentou por muito tempo. Os homens procuraram sair dos
“desertos” onde, inclusive, também eram atingidos pelo sistema, e procuraram
construir o futuro: liberdade, paz, prosperidade, igualdade, etc. Sentir-se
livre era o mais importante, sentir-se livre e autor de seu destino. Desde a
Revolução Americana 1776, Francesa 1789, Haitiana 1791, “Liberté, Egalité,
Fraternité” (Liberdade, igualdade, fraternidade, em português do francês) eram
temas que estavam no coração do homem moderno. Invadiram a cozinha e foram
experimentar na medida que distribuíam esse tal de Caviar!
Após a primeira (1914-1918) e a segunda guerra (1939-1945), a
maior parte do mundo chegara à conclusão de que somente o Estado
Democrático de Direito era a solução para tantos anseios. Os muitos muros da
separação caíram. Contudo, para nossa surpresa, hoje em dia os homens
esqueceram-se de quão difícil foi a conquista e o compartilhamento da receita
do Caviar (talvez porque a receita tivesse sido alterada ou erraram em alguns
dos passos) e viveram como se dela nunca tivessem provado, ainda
cantando: Você sabe o que é caviar?...Geralmente quem come esse
prato tem bala na agulha, não é qualquer um. Quem sou eu pra tirar essa chinfra
se vivo na vala pescando muçum. Mesmo assim não reclamo da vida apesar de
sofrida consigo levar. Um dia eu acerto numa loteria e dessa iguaria até posso
provar.
Hoje, no Brasil, em plena campanha eleitoral, salta aos olhos o fruto de longos
anos de trabalho da classe política brasileira e em alguma medida, nosso
também. Aos gritos, em diversos meios de comunicação é possível ouvir
sentimentos que norteiam a escolha do eleitor: ressentimento, medo, egoísmo,
revolta, ódio, etc. Nesse calor, os políticos profissionais não estão
preocupados com o tal do “Caviar”, pois os sentimentos, alimentados historicamente,
já não tem paladar para Democracia. Os candidatos estão atentos ao sentimento
popular, mesmo que seja contra a receita histórica, como num teatro assumem o
personagem que nós queremos. Já se ouve pessoas dizendo: intervenção militar
já! Os mesmo que querem que a História diga que ela nunca existiu. Por nos
preocuparmos mais com cultura e costumes do que com política, produzimos frutos
anti-civilização.
Aqui, em nosso país, o Estado Democrático é jovem! No entanto preferimos acreditar
que nunca o provamos ou que isso é da Europa ou dos Estados Unidos, ou até
pior: que nunca deveríamos ter provado. Nossa jovem República está sofrendo
acusações que não é pertinente. A democracia tem suas próprias regras e
consequências. O Caviar já foi conquistado, mas ainda temos pessoas em público
(inclusive supostos intelectuais) requerendo do conteúdo da receita aquilo que
ela não pode dar, senão deixará de uma só vez de ser Caviar! O que precisamos é
conhecer bem e valorizar a Democracia, discutir política o ano todo e não
somente em véspera de campanha, então males como: messianismo político, o
excesso da judicialização, a indomável sede de consumo, o Estado paizão e
vigilante, etc. terão menos chance de insurgir.
A Democracia que, com suor e sangue
foi conquistado, para TODOS, só se mantém com EDUCAÇÃO PARA VIDA e de
qualidade. Mas como valorizar aquilo que desconhecemos, embora comendo dele
todo dia? É de partir o coração ver pessoas discutindo quem será o próximo
chefe de cozinha nesse país, quando na verdade são 513 mais 81 chefes, fora os
auxiliares que elaboram melhorias na receita do Caviar. Ah, mas você tem
certeza que sabe o que é Caviar?
Eduardo Leite –
É Historiador
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